Essa semana surgiu a possibilidade de colocar em prática algo que há um bom tempo pensamos em fazer e foi ficando para depois, que é o espaço do Crítico convidado. Para estrear esse espaço convidamos Pietro Barana que é Produtor, Diretor, Ator e roteirista, italiano que vive no Rio de Janeiro. Ele respira cinema! Nada mais acertado que chamar um italiano para avaliar um filme Francês dirigido por um alemão para falar para o público brasileiro. Olha que legal essa mistura de nacionalidades! Assim como o cinema é a soma de todas as artes, ele abraça a cultura de todos os povos.

Obrigada por ter aceito o convite!

Então vamos conferir a crítica de Pietro Barana.

 

Crítico convidado: Pietro Barana

Essa foi minha primeira experiência de ir ao cinema como convidado para uma cabine de imprensa. Adorei! É tão lindo poder assistir (de graça), julgar (nenhum juiz é sem pecado), e ainda compartilhar (quem sabe) a crítica sobre o filme, e receber comentários (duvido) e ataques (com certeza). Devo agradecer a querida Andrea Cursino, do site Cinema para Sempre que me convidou a ir no lugar dela, para avaliar o último trabalho do Diretor alemão Wim Wenders (quem sou eu para tanto?). Fui pesquisar sobre o filme na noite anterior ao evento, e lembrei que já havia lido a respeito da sua participação no Festival de Veneza e que se tratava, apesar do diretor ser alemão, de um filme francês.

Engraçado: estou finalizando um roteiro adaptado do premiado livro italiano Odio i Film Francesi (nel Fil m ondo) [Odéio Filmes Franceses (no Fil m undo)], de Giovanni Luca Boschiero, onde no incipit há uma aprofundada paródia dos filmes franceses, por meio do protagonista, que odeia filmes franceses, mas acaba acordando dentro de um deles. Para sair dessa ele sabota o filme inserindo nele uns elementos desde sempre ausentes no cinema autoral francês: imprevisibilidade, ação e violência. Bom: ele não ia gostar deste filme também!

Mas gostei do Wenders assumir isso, e colocar uma ação forçada no meio da história, dizendo que não estava prevista. Não me expliquei direito? Bom, filme francês não é mole de explicar.

Mas como pode se pensar em filmar em 3D um filme adaptado de uma peça de teatro (de Peter Handke), onde praticamente há uma cena/cenário só e muita fala? Parece que o Wenders tenha optado para essa solução justamente para fazer com que o público entrasse no palco. Mas daí pergunto: porque fazer um filme? Deixa o troço no teatro!

Mas, apesar disso, foi gostoso e inovador ver cenas normais em 3D (sem dragões, monstros, super heróis etc.), sobretudo as panorâmicas iniciais e, por sinal, com uma linda trilha sonora, sugerindo o que está por vir: “Perfect Day” , de lou Reed – “ Oh, it’s such a perfect day, I’m glad I spent it with you.”  (Oh, é um dia tão perfeito, estou feliz que o passei com você). Esse 3D, que pretende reproduzir simplesmente, sem efeitos, a visão humana, é chamado de Natural Depth (Profundidade Natural), e foi inventado pelo pioneiro europeu Alain Derobe. E de fato, passa despercebido e traz exatamente o efeito desejado pelo diretor. Parabéns!

Mesmo assim, o 3D ainda não me convence, e a tecnologia tem chão ainda, não somente pelo problema técnico, que pode acontecer, mas pelo desconforto que esses óculos proporcionam, com essa moldura enorme que incomoda e atrapalha, aparecendo nas bordas da visão.

Logo de cara eu digo que filme assim, cheio de diálogos, seria melhor assistir em versão dublada. Eu sou a favor da língua original, mas há casos em que prefiro a versão dublada, e esse é um deles. Se não, você acaba tendo de escolher: ou fica lendo as legendas, ou fica assistindo o filme, inclusive porque muitas vezes as legendas… bom, deixa pra lá.

Ok, não falo francês, nunca o estudei, mas o entendo bastante, por ser uma língua latina, e por isso muito parecida ao italiano (eu sou italiano), ao português, ao espanhol, ao catalão, etc. Mas falo outras línguas, e às vezes não dá para entender essas também. Aliás, até em italiano nem sempre entendo. Será que sou burro? É que às vezes falam muito rápido nos filmes, e baixo, e sem olhar para a tela. Daí fica difícil. Para inovar, algum cineasta ousado poderia arriscar uma versão mista, que permitiria ouvir a voz e apreciar a atuação dos atores nas cenas com poucas falas, e dublar as outras.

Mas que bobagem que falei! Para concluir este parágrafo sobre dublagem e legendas, vale fazer uma crítica/sugestão geral para os filmes no Brasil, mas na Itália também, e acredito em muitos outros países: legendar as falas das canções!!! Todo mundo esquece! E isso, mais ainda quando o texto tem tudo a ver com o filme. Por exemplo, neste, o filme acaba com uns versos de uma canção, e quem não entende inglês se ferrou, porque aí está o sentido final, a famosa mensagem do filme. E qual seria?

Eu não vou falar: vai lá ver e comente no site depois.

Bom, filme francês quase sempre tem algo estranho, de não fácil digestão. Isso a gente sabe! Um casal de amigos (coloridos?), um homem e uma mulher, conversam sobre a vida e as sensações que ela nos traz num verão francês, numa casa de colina com vista sobre Paris (que pertenceu a Sarah Bernhardt). Falam da primeira experiência sexual dela, mesmo sem falar em sexo (mas ele ia gostar de saber mais), do passeio dele em Aranjuez, perto de Madrid, etc.

É um filme francês autoral em tudo e por tudo, e o Wim assume isso sem vacilo, e por isso ganhou a minha estima (será que ele se importa?). Muito Nouvelle Vague, muito falado, bastante teatral nao jeito de falar mais do que na interpretação. Mesmo assim, eles se escutam direitinho, sem interromper (coisa tão rara…).

Com um toque de nonsense, o filme oferece alguns conteúdos interessantes, como era de se esperar depois de uma hora e meia de diálogos: o meio ambiente hostil e barulhento dos dias de hoje (nada de novo), a enganosa satisfação da mulher que aceita homens frágeis que a enxergam como inalcançável (será piedade?), e as diferenças entre esses dois bichos. Não é muito.

Mas, se você gosta de cinema artístico, de poesia cinematográfica, de calma e tranquilidade, de diálogos não convencionais, de paz, vai ter de sobra. Boa a sacada do personagem do escritor criando a obra (que não existia na peça original), da forte visualização mental e fantasia que ele precisa para poder escrever. Uma pérola, neste sentido, é o Nick Cave tocando piano e cantando “Into My Arms” , num cruzar de planos bem acertado.

Obra poética, onírica, um pouco surreal, apesar de não conter coisas absurdas ou fora do tempo. Vale a pena!

Vou terminar com uma surpresa. Ok, vou contar o sentido final do filme sim! And the Oscar goes to (E o Oscar vai para): só nos resta o Amor. Vai lá conferir e me diga se me equivoquei. Que mico seria! … Mas acho que nao. A canção final é “The World is on Fire” de Gus Black, e os versos falam: “Hey, hey, hey, there’s nothing left to say, the world is on fire, and I love you, I love you…” (Hey, nao tem mais nada a falar, o mundo está em flamas, e eu te amo, te amo…). THE END

Concluo dizendo que toda crítica é construtiva, e o fato que seja positiva ou negativa é secundário. O importante é fazer cinema, emocionar, inovar. E este filme deu muito o que falar (não é?), e por isso, agradeço. Obrigado Wim!

Pietro Barana

 

 

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