Através do olhar de Madá (Regina Casé) uma caseira de uma casa luxuosa numa à beira mar, somos convidados à embarcar na história de uma família que tem os seus bens confiscados. O drama político que atingiu o Brasil entre 2015 e 2017 é palco dessa dissolução econômica familiar, e a caseira juntamente de outros membros que trabalhavam na casa se juntam. Em 2016, o cancelamento da tradicional família de Edgar e Marta leva a suspeitas de que algo está fora do comum, e Madá e o velho patriarca da família suspeitam de toda a história que os cerca.
Três Verões, filme de Sandra Kogut estreia nos cinemas franceses no próximo dia 22. A pré estreia que aconteceu no dia 11 de março, antes do lockdown no país ficou em cartaz por apenas 4 dias. O filme voltará a ser exibido nas sala na França. No Brasil, ainda não há data.
A família então procurada no esquema da lava jato tem a sentença de seu patriarca. Após esse episódio traumático os outros empregados juntam-se ao avô, pai de Edgar para retomar as atividades domésticas. Movimentados por uma mulher forte que é Madá e cômico o grupo que permanece na casa precisa arrumar saídas criativas e econômicas para viver.
O filme que exala o aroma cômico, também atravessa todas as questões já sabidas ao longa trama. Pode-se dizer que o lugar que ocupa o tragicômico do filme é parte de princípios do gênero sobre a trama.
A personagem interpretada pela atriz Carolina Pismel são de uma assistente de direção muito dedicada que está trabalhando nas filmagens de uma grande publicidade na casa da família. O lugar da personagem principal dentro da trama acaba-se confundindo com o personagem da publicidade. A longa sequência de ensaios de decorar as ações e falas da publicidade acabam se transformando em um desafio. A empregada que até então nunca havia tido contato com a atuação frente as câmeras enfrenta por horas as suas dificuldades e amarras. Além da desenvoltura da personagem dentro das gravações, destaca-se o improviso e as percepções do diretor. Ao longo dessa gravação, momento em que a casa da família procurada pela lava jato, é invadida por holofotes, assistentes, cenografia e iluminação.
As consequências da corrupção da família estão todas presentes nos objetos, arte e cenário do filme. A riqueza, os excessos, os grandes espaços, grandes obras de arte, esculturas, iates, piscina, e todos os artigos luxuosos são da direção de arte elaborada. Tanto para fins estéticos, quanto para os fins cafonas dessa família que enriquece e de modo ilícito, Madá também desfruta desses ambientes resignificando-o para a realidade.
Além de toda a comicidade, e resiliência da Madá, as questões existenciais atravessam a personagem, tanto dela como do patriarca. O senhor já com algumas questões de saúde, quer se locomover, e têm curiosidade nos erros de criação com o filho. Diante de toda a pureza do discurso que ele narra, há uma dimensão real de corrupção que a trama apresenta. Toda a prerrogativa de ter dado a boa educação, por ser um professor aposentado, é parte da contextualização dessa narrativa. O silêncio dele, alguns passos dados, e muitas brechas dimensionam o tempo mais esgarçado da sua vida neste instante.
Oposto da dinâmica de velocidade trazida por Madá, sempre muito ágil, de resolução de conflitos, enfrentamentos com os agentes do governo, o patriarca age como um eremita ao longo desse conflito interno que apresenta. Madá muito exigente com suas ações, age com muitos conflitos internos, principalmente diante das câmeras da publicidade.
A personagem de Carolina Pismel sempre com muito charme e desenvoltura dentro do set montado para a gravação de uma publicidade. Vemos nuances belas e repleta de sutilezas nas camadas da personagem, e que casam com o ambiente. De muitas formas há uma construção de personagem-ambiente que pode-se atravessada dessas sutilezas.
Três Verões (2019); Ficção/color/ Brasil/França
direção Sandra Kogut; 93 minutos;
Roteiro Sandra Kogut e Iana Cossoy Paro
Produção Marcello Ludwig Maia; Fotografia Ivo Lopes Araujo; Montagem Sergio Meckler, Luisa Marques; Música Berna Ceppas
Com Regina Casé, Rogério Fróes, Octávio Müller e Gisele Fróes, Vilma Mello
Festivais: Toronto International Film Festival, Festival de Havanna 2019 (melhor montagem); Festival Antalya Golden Orange Film 2019 (melhor atriz); Festival do Rio 2019 (melhor atriz)
