Filme faz parte da Première Brasil: Hors Concurs - Longa Metragens (Foto: Divulgação)

O longa “O Diabo na Rua no Meio do Redemunho” foi o título que Bia Lessa escolheu para transportar a obra-prima de Guimarães Rosa para as telas de cinema. O título foi tirado de uma das frases mais famosas do livro, que narra a trajetória do jagunço Riobaldo, enfrentando seus demônios em guerras pelo sertão nordestino. Riobaldo emenda uma história na outra, mistura lembranças e impressões de um jagunço entre guerras e encruzilhadas. E são muitos os demônios que Riobaldo combate. Ele encara seus medos, vislumbra o Diabo ele mesmo, sempre à espreita para uma emboscada de vida ou morte. Enfrenta bandos de jagunços em disputas sangrentas. E ainda trava a maior de suas guerras, a batalha amorosa, a maior das tentações, quando busca resistir à paixão intensa por Diadorim, que luta ao seu lado nas encruzilhadas do sertão. Produção do longa foi realizada pela produtora 2+3 Produçõescocoprodução da Globo Filmes, Canal Brasil, Riofilme, 2+2 Comunicações, Em Associação Com: Quanta, Effects Film e O Grivo. O longa, que estreou na última segunda (09), será exibido na repescagem do Festival do Rio em 16 de outubro e está também selecionado para a seleção da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo 2023.

Bia Lessa encarou o desafio de levar para o cinema o jeito sinuoso de contar histórias desse jagunço. Riobaldo envereda por um vaivém de episódios em suas andanças pela imensidão de um sertão imaginário, inventando uma linguagem muito original, um falar brasileiro inimitável. Por isso, Bia optou por transcrever as cenas do livro usando apenas frases tiradas do texto de Guimarães. O movimento de vaivém das histórias do jagunço vai pautando as cenas em que os atores também criam uma linguagem corporal própria para narrar a mistura de besta--fera e de ser humano em cada personagem, em cada paisagem.

O filme é resultado de um longo trabalho de Bia com a literatura de Guimarães Rosa. Primeiro, ela trabalhou o texto do escritor numa exposição no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo. Depois, transformou o livro em peça de teatro, com a parceria do arquiteto Paulo Mendes da Rocha, em montagem de enorme sucesso de público e de crítica, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio, e no SESC, em São Paulo. E, durante a pandemia, entre 2020 e 2022, retrabalhou as histórias de Riobaldo, desta vez para o cinema, com os mesmos atores da peça. O elenco reúne Caio Blat, Luiza Lemmertz, Luisa Arraes, Leonardo Miggiorin, Clara Lessa, José Maria Rodrigues, Lucas Oranmian, Daniel Passi, Elias de Castro e Balbino de Paula.  

Meu primeiro filme “Crede-mi”, baseado na obra “O Eleito”, de Thomas Mann, nasceu de uma necessidade imperativa. Um fato: eu me encontrei com uma pessoa numa sexta-feira, que me propôs um trabalho de forma bastante atípica, me oferecendo um envelope com o meu pagamento em espécie. Fiquei constrangida, marquei de conversarmos na semana seguinte, e no sábado recebi a notícia de que essa pessoa havia se enforcado. Esse fato colocou diante de mim uma questão: como eu não percebera o limite emocional em que aquele homem estava vivendo? Percebi ali que nossos códigos de interpretação, todos eles, estavam caquéticos, e que representávamos os sentimentos a partir de convenções, e não a partir da observação da própria vida. Vi então que eu tinha que abandonar provisoriamente o teatro e ir documentar a vida, ver a vida, estar na vida – e por isso o cinema. Meu segundo filme, “Então Morri”, se deu para aprofundar essa experiência de modo radical, abandonando o apoio de uma obra literária e de um roteiro e filmando as pessoas tal qual se apresentavam na vida. A partir das cenas reais capturadas no dia a dia, manipularíamos as cenas na montagem, criaríamos uma narrativa formada pela relação de uma cena com a outra. Esse filme foi feito quase imediatamente após o primeiro, uma continuação da mesma pesquisa iniciada com o “Crede-mi”. Agora, com “O Diabo na Rua, no Meio do Redemunho”, o filme vem pelo desejo de dialogar com a linguagem cinematográfica da mesma forma que o Guimarães estabeleceu um diálogo com a língua portuguesa escrita e oral”, comentou a diretora. 

Na tela do cinema, os atores transitam por um espaço sem referências geográficas nem fronteiras. Se no teatro os personagens estavam aprisionados numa jaula construída por Paulo Mendes da Rocha, na tela do cinema, eles perambulam num vazio acinzentado, atordoados entre o delírio, a memória, a fúria e a paixão. São personagens de um sertão onde a ferocidade das emoções é o que há mais de concreto diante do trágico da vida intensamente vivida. O sertão imaginário de Bia, como o de Guimarães Rosa, expõe as encruzilhadas da tragédia na representação do mundo como lugar de dúvidas dilacerantes. Neste sertão nebuloso, o próprio cinema, como suporte para apreensão da realidade, é ferozmente posto em questão por uma metafísica que desafia os limites da linguagem. 

“O Diabo Na Rua No Meio do Redemunho”  (2023) é a quarta incursão pelo audiovisual de Bia Lessa, depois dos longas metragens “CREDE-MI” (de 1996, dirigido em parceria com Dany Roland), de “Então Morri” (de 2016, outra parceria com Dany Roland) e de uma série audiovisual, a trilogia “Cartas Ao Mundo” (pesquisa autoral de Bia em torno da linguagem cinematográfica de Glauber Rocha). Bia Lessa é uma artista multimídia com uma extensa produção e já trabalhou com teatro, ópera, exposições, shows, desfiles de moda, videoarte, instalações, além de performances e trabalhos de curadoria para museus e bienais. 

Serviço – Sessão de O Diabo na Rua no Meio do Redemunho

16/10 às 21h10 no Estação NET Rio 5

Ficha Técnica

Direção e RoteiroBia Lessa

Elenco: Caio Blat, Luiza Lemmertz, Luiza Arraes, Leo MiggiorinClara Lessa, José Maria Rodrigues, Daniel Passi, Lucas OranmianElias De Castro e Balbino De Paula

Produção2+3 Produções 

CoproduçãoGlobo FilmesCanal BrasilRiofilme2+2 Comunicações em associação com: QuantaEffects Film e O Grivo 

ProdutoresLucas Arruda e Bia Lessa 

Produtores AssociadosGuel Arraes e RT Features

FigurinosSylvie Leblanc

CenografiaBia Lessa 

AdereçosFernando Mello da Costa

Direção de FotografiaJosé Roberto Eliezer, ABC 

MontagemSérgio Mekler e Renata Catharino

Trilha Sonora e Produção MusicalEgberto Gismonti

Trilha Sonora e Música OriginalO Grivo 

Pesquisa Sonora: Dany Roland

Direção de ArteToni Vanzolini

MixagemRicardo Reis, ABC 

Supervisão de Edição de SomMiriam Biderman, ABC  

Coreografia e Preparação CorporalAmália Lima 

Design GráficoTon Zaranza

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