The Lighthouse de Robert Eggers com Willen Dafoe, Robert Pattinson, Valeriia Karaman. Estados Unidos/ Canadá 2019 110 minutos DCP

Preto e branco, Nova Inglaterra, início do século XX. Numa ilha de rochas no meio do oceano, dois faroleiros trabalham para a orientação do navios marítimos em um farol. Ambientado por volta do ano de 1810, em um lugar próximo a Thomas Wake (Willem Dafoe) e Ephraim Winslow (Robert Pattinson), dois homens isolados experimentam no trabalho braçal os afetos causados pela solidão e isolamento e trazem como linhas de desejo a violência e a libido em um lugar úmido pelos aspectos da masculinidade e suas camadas.

 Thomas, interpretado por Willem Dafoe é o arquétipo do masculino alfa, e o chefe duro e autoritário. Ephraim Winslow intepretado por Robert Pattinson é o recém chegado ajudante que fica encarregado das questões domésticas do farol, e da cabana. Ephraim está encarregado de limpar a casa, engraxar a maquinaria, eliminar as fezes, fechar as janelas. Entretanto os dois vivem uma situações disparadora na relação entre os dois: Thomas é o responsável em subir no farol e comandar durante as noites a operação magnânima da luz que guiará os navegantes. Engraçado que pouco se fala dessa última, a função do farol como guia de terceiros é pouco mencionado ao longo do filme. Com isso a relação entre os dois fica ainda mais tensionada e verticalizada na perspectiva dialógica entre os dois.

Ir ao farol e subir para admirar a luz intensa e branca que o farol emite, é apreciar a vida. E como a ação de Tom deixa evidente, o gozar e sentir-se próximo do prazer delirante. Segundo Tom, o “velho lobo do mar” é o aposto que fica em jogo entre os dois.  Entre tantas homenagens o gênero é um terror psicológico, e com textos e monólogos dignos de impulsividade beckettiana.

Em muitos momentos da narrativa textual não sabemos o que de fato aconteceu, quem falou o que, quanto tempo estão ali, e as quantidades absurdas de repetições de textos. Sabemos que o textos beira ao delírio em muitas camadas, inclusive micro ações repetitivas trazidas pela genialidade de Dafoe, e a coragem de Pattinson. Robert Pattinson marcado pela Saga Crespúculo, não traz o que já vimos. Muito pelo contrário, Pattinson mostra-se um ator britânico de extrema qualidade e “recheadinho” na comunhão com Dafoe. Ao contrário do que muito pensamos, não tomamos susto de Dafoe, pois apesar do texto ser aterrorrizante, não tem gatilhos do terror, e nos deixa intrigados com-quem-falou-o-quê?

A tempestade é um dos triângulos formado na relação dos dois. De uma análise objetiva, Thomas conta a história que ao matar as aves do mar, vulgo gaivotas, grandes tempestades surgem. Como um adolescente rebelde e raivoso Ephraim age com ódio contra uma das gaivotas que faz côco na água que deveria estar limpa para beber. A morte da gaivota é descoberta por Thomas, e que usa como justificativa racional para a imensa tempestade.

Por outro lado, mitologia aparece em doses cavalares. As sereias e Netuno da mitologia romana, trazem outras imagens. Netuno, um dos mitos que traz os oceanos aparece em perspectivas semióticas do filme, nas grandes ondas, na tempestade e em fotografias delirantes.

A trilha sonora do filme permeada pelo clássico marcado de tempo do barulho que o farol faz ao realizar uma volta em torno de si marca grande parte do início do filme. O tempo marcado pelo grave contrabaixo, referência ao cinema mudo, e a tempestade silenciosa assombra a história do início ao fim. Quanto ao tempo que se passa na ilha rochosa, pouco temos informações. O segredo que Thomas guarda de Ephrain é descoberto quase ao final do filme que desencadeará uma estranhíssima sequência de vingança. Ephrain descobre um enorme caderno de anotações que serve como ponto para os trabalhos diários registrados por Thomas. E isso transforma a relação com Thomas em algo ainda mais rebelde.

O filme todo em preto e branco, na dimensão da tela quadrada, próxima ao formato 1. 19:1 a sequência inicial do filme traz uma ode ao cinema soviético e ao cinema mudo. Além disso o espectador surta na clausura do formato que corta a ilha, a cabana, o horizonte em um formato quadro. O roteiro escrito por Eggers, Max e Robert traz o delírio e a forma asquerosa de dois seres humanos em convivência.

Entre tantas fortes cenas que o filme traz para a interpretação dos atores, descreverei uma das sequências mais intensas que já vi. Ephraim

briga com o Thomas, e o pede para latir, coloca uma coleira, o leva para fora de casa, como um cachorro. Ephraim joga ele dentro de um buraco, de uma forma pouco óbvia, usando o peso de seu corpo, como o estivesse arrastando para dentro da cova. Thomas com pouca ou quase nenhuma resistência cai dentro do buraco. E Ephraim começa a enterrar ele com ajuda de um instrumento de pá e muita (!) terra escura. Thomas começa a ficar fraco dentro da cova, e ao ser soterrado, começa a gestualizar uma desistência. Ele fecha os olhos, e num gesto abrupto Ephraim pula dentro da cova e pega no bolso um molho de chaves. Após uma sequência eletrizantes Ephraim começa a rastejar em direção à escada do farol, e com a cara completamente mergulhada em graxa escura avista a luz farol. Após uma girada, o farol abre-se uma pequena porta na qual Ephraim é sugado e tem um transe que o toma por completo. A boca completamente aberta e num grito assombrante o personagem é tomado por outras forças e é lançado pelas escadas numa força monumental.

O filme ainda que marque presença com grandes atores do cinema mundial não irá alavancar com muita facilidade devido ao tema, ao inglês arcaico, e a estrutura do filme.

O filme dirigido por Robert Eggers com Willem Dafoe, Robert Pattinson, Valeriia Karaman. A produção também conta com o nome de Rodrigo Teixeira. Filmado nos estados Unidos e no Canadá com 110 minutos de duração. O filme estréia nos cinema dia 02 janeiro e está no quadro Panorama do Cinema Mundial do Festival do Rio 2019.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui